domingo, 21 de setembro de 2014

CHORO UTERINO


Quando meu marido morreu, chorei muito. Tive hemorragia. Minha menstruação desceu por quase 40 dias.
Chorei tanto que meu útero chorou também!
Eu sou assim: intensa! Em tudo! Não tem jeito... Quando entro, eu entro!!! Entro de cabeça!!! Não entro pela metade! Eu mergulho de cabeça!
No trabalho, nos relacionamentos, na vida! Vivo intensamente!!! Tudo!!! Isso talvez seja péssimo. Não recomendo a ninguém! Já paguei muito caro por isso!!
Sou muito íntegra em tudo o que faço! As vezes isso me custa caro... mas sou assim!!
Claro que algumas coisas me cobraram um preço alto demais e hoje pago por isso. Não recomendo.
Bem minha mamãe morreu.
Sofri. Fui morar com ela quando sofreu o primeiro AVC. Precisava ajudar meu pai a cuidar dela.
Mas quando fui pra lá , olha, não sei o que dizer sobre isso, mas senti, ou pressenti, ou percebi, ou entendi, que mamãe iria embora!
Eu chorava todos os dias ao vê-la. Era tenebroso.
Foi quando Eu pedi à Deus uma palavra. Ele me deu quatro.
A primeira.
Eu trouxe uma missionária para orar em casa. Ela me olhou firme nos olhos, e sem hesitar, me disse: -Deus vai levar sua mãe.
Daí chorei. A noite peguei a Bíblia e pedia a Deus que me falasse pessoalmente. Abri, onde dizia, pra meu desalento para eu deixar os mortos aos mortos... E cuidar do funeral...
Dias depois minha mãe foi parar na UTI. A tristeza machucava meu coração. Fui com meu pai na visita rotineira.
Levei a Bíblia. A tristeza era grande. Falei ao meu pai: - Vamos orar e ler a Palavra. E abri a Bíblia. Meus olhos caíram sobre o versículo. “ Preciosa é a vista do Senhor a morte dos seus Santos!”. Depois, titubearam.
Levantei lentamente o olhar... Meu pai olhava apaixonadamente para minha mãe, que sorria como uma criança singela para ele, num clima de amor indescritível!!
Não pude interromper.
Fechei a Bíblia de novo e a abri rapidamente. Antes que eles se dessem conta, ou que eu achasse isso, encontrei outra passagem bíblica. Lí o Salmos 23.
Mas não consegui correr de outras duas revelações. A irmã Lindaura foi bem clara quando falou para mim da passagem da minha mãe e a pastora Lídia também.
Enfim, chorei tudo que o tinha pra chorar... todas as lágrimas que tinhas as chorei antes de seu falecimento.
Daí comecei a chorar uterinamente.
Na verdade, uma hemorragia tímida ( o choro uterino) começou uns quatro meses antes de ela falecer... Minha menstruação desceu e não parou mais... Após sua passagem meu útero derramava lágrimas de sangue sem qualquer prenúncio pra parar.
Daí, tive anemia.... Perdi muito ferro... e as consequências inevitáveis!
Ah, mamãe, dia 19 você completou 84 anos... Feliz aniversário!
Eu já estou sarando da anemia tá!!!
Te amo e sempre vou te amar!

quarta-feira, 17 de setembro de 2014

segunda-feira, 9 de junho de 2014

MUDANÇA SOCIAL PROFUNDA

A Polícia reprime o que é óbvio: o crime contra a exploração sexual de meninas e adolescentes. Que louvável e digno! Porém, conter e reprimir o crime não vai pôr comida na casa dessas adolescentes. Não vai dar o sustento que essas meninas precisam. Não vai dar o suporte e a referência do qual essas crianças  carecem. Tire-as da rua, da boca do lobo, e as deixe morrer de fome dentro de casa! Não resolve! Precisamos de políticas públicas que mudem profundamente essa realidade social para que essas meninas não queiram se prostituir, para que elas não precisem disso para conseguir o que precisam... Que elas tenham mecanismos decentes e dignos para acionar e com eles conseguir seus meios básicos de sobrevivência, sem precisarem se prostituir, lançar mão de venderem seus corpos para conseguirem seus objetivos. Que país pobre que somos!!! O que adianta reprimirmos essa prostituição por parte das adolescentes sem dar a elas condições dignas de galgarem espaços de cidadania em que consigam seus objetivos, seus ganhos e meios para ter suas necessidades legitimamente atendidas sem que tenham que se vender para isso!

domingo, 5 de janeiro de 2014

O TEMPO E AS JABUTICABAS



Contei meus anos e descobri que terei menos tempo para viver 
daqui para frente do que já vivi até agora. Sinto-me como aquela 
menina que ganhou uma bacia de jabuticabas. As primeiras, ela 
chupou displicente, mas percebendo que faltam poucas, rói o caroço.
Já não tenho tempo para lidar com mediocridades.
Não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflados.
Não tolero gabolices. Inquieto-me com invejosos tentando destruir
quem eles admiram, cobiçando seus lugares, talentos e sorte.
Já não tenho tempo para projetos megalomaníacos.
Não participarei de conferências que estabelecem prazos fixos
para reverter a miséria do mundo. Não quero que me convidem
para eventos de um fim de semana com a proposta de abalar o milênio.
Já não tenho tempo para reuniões intermináveis para discutir estatutos, normas, procedimentos e regimentos internos.
Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas,
que apesar da idade cronológica, são imaturos.
Não quero ver os ponteiros do relógio avançando em reuniões
de 'confrontação', onde 'tiramos fatos a limpo'.
Detesto fazer acareação de desafetos que brigaram pelo majestoso cargo de secretário geral do coral.
Lembrei-me agora de Mário de Andrade que afirmou: 'as pessoas
não debatem conteúdos, apenas os rótulos'.
Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos, quero a
essência, minha alma tem pressa...
Sem muitas jabuticabas na bacia, quero viver ao lado de gente
humana, muito humana; que sabe rir de seus tropeços, não se encanta com triunfos, não se considera eleita antes da hora, não
foge de sua mortalidade, defende a dignidade dos marginalizados,
e deseja tão somente andar ao lado do que é justo.
Caminhar perto de coisas e pessoas de verdade, desfrutar desse
amor absolutamente sem fraudes, nunca será perda de tempo.'
O essencial faz a vida valer a pena.

Rubem Alves